Não vivo de poesia, vivo a poesia.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Sua Vida de

Sua vida de
Suavidade
Era como o solo 
De um piano ao fundo

Vital ida de
Vital idade
Vitalidade
Fazia todos sorrirem

Lorena Sabino, Goiânia, 26 de fevereiro de 2014.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Auto-retrato

A maneira de andar
como quem busca
estrelas pelo chão.
A cabeça a dar contra os muros.
Em cada olho, o mundo como um punhal
- cravado.
O pensamento a abrir estradas
numa várzea distante.
Os ângulos do sonho formando orlas
povoadas de fêmeas
que a meu encontro viriam
do outro lado, em lânguidas posturas.
Diante do mar, a sede, a sede
de beber a vida em infinitas viagens.
As garras de gato ante paredes impostas.
A impaciência de que chegue a manhã e a praia,
a tarde e o amor.
A maneira de andar
como a fugir dos homens
- e tê-los contra o peito.
O pensamento a atirar pedras
contra as vidraças
que guardam os produtores frios
de injustiças.
O coração que bate
ao som de fábulas.
Que bate
contra rochedos mortos
numa praia de cinza
onde palpita o primeiro amor.


Coração eterno.
O amor eterno
que bate.
A alegria! A alegria!
Íntima, espantada de si mesma, gloriosa
como palmas a se abrirem aos quatro ventos,
a alegria de sentir-me vivo, a alegria
de bicho do mato, criança, dominada,
eterna.

-Afonso Félix de Sousa

Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

-Cecília Meireles